O Mercado Bitcoin (MB), maior corretora de criptomoedas do Brasil, disse em um processo que corre na justiça do estado de São Paulo que não possui bitcoins.
Em resumo, o Mercado Bitcoin recorreu de uma decisão a favor de um usuário que alegou ter sofrido fraude em sua conta, resultando na perda de 0,88 bitcoins.
O autor alega ter sido vítima de um ataque hacker em 2020, que permitiu movimentações irregulares em sua conta na corretora, incluindo saques de bitcoins e reais. Ele solicitou a devolução dos bitcoins furtados e contestou todas as transações.
O Mercado Bitcoin, em resposta, reconheceu as transações fraudulentas, mas colocou a culpa no usuário.
A defesa do Mercado Bitcoin argumentou que sua plataforma possui várias medidas de segurança para proteger as contas dos usuários, incluindo autenticação de dois fatores, confirmação de transações por e-mail, e uso de login e senha exclusivos.
A empresa alegou que todas essas medidas estavam ativas e foram usadas nas transações questionadas, indicando que o acesso à conta foi legítimo.
O MB também menciona jurisprudência relacionada a casos de phishing, indicando que situações semelhantes foram consideradas como culpa do usuário ou de terceiros, e não falha da instituição financeira ou plataforma envolvida.
A primeira decisão do processo condenou o Mercado Bitcoin a pagar R$ 9.963,59 ao autor, com correção monetária desde a data dos fatos e juros desde a citação.
Contudo, o Mercado Bitcoin argumentou contra a decisão, alegando que não houve participação da empresa nos fatos descritos no caso e que não houve falha na prestação de seus serviços.
Além disso, a corretora sustentou que as transações realizadas na conta do cliente foram efetuadas usando sua senha pessoal e confirmadas por e-mail, indicando que todas as medidas de segurança implementadas pela empresa foram seguidas.
Ao se recusar a devolver o valor em bitcoin ao cliente, o Mercado Bitcoin argumentou que não possui ativos e não os ‘fabrica’, somente disponibilizando a plataforma para os usuários.
As corretoras de criptomoedas, vale lembrar, podem ter suas próprias reservas de Bitcoin, no entanto, este não parece ser o caso do Mercado Bitcoin, que afirmou não possuir ativos, o que sugere que a empresa não possui reservas próprias.
“A impossibilidade de cumprimento de eventual condenação em restituir o autor valores em bitcoins configura-se justamente no fato de que a ré não possui ativos e não os ”fabrica”, visto que tão somente disponibiliza uma plataforma para que os usuários transacionem entre eles.,” diz o MB.
O Mercado Bitcoin também argumentou que, ao contrário dos bancos, não transaciona com os ativos de seus clientes e não é o proprietário dos ativos negociados em sua plataforma.
“Desse modo, tem-se que os bitcoins já foram comercializados e ”pulverizados” no mercado, não sendo viável sua devolução “em espécie”. — disse a defesa do Mercado Bitcoin.
Portanto, segundo a corretora, não seria possível condená-la a “devolver” os bitcoins retirados da conta do autor, pois esses ativos foram enviados para uma carteira fora do sistema do Mercado Bitcoin.
Em outras palavras, a corretora alega que, uma vez que os bitcoins foram transferidos para fora de seu sistema, eles se tornaram inacessíveis e, assim, não podem ser devolvidos pela própria natureza descentralizada e irreversível das transações da criptomoeda.
A defesa explica, portanto, o funcionamento básico das transações com bitcoin, mas abre caminho para que usuários e especialistas do setor questionem suas reservas.
De acordo com Raphael Souza, advogado especialista em criptomoedas e direito digital, embora o Marco Legal das criptomoedas não exija que corretoras mantenham reservas em criptomoedas, é essencial para a confiabilidade e transparência dessas corretoras demonstrar sua solidez financeira.
“Manter uma reserva em criptoativos é crucial para compensar clientes em casos de ciberataques. A segurança dos ativos dos clientes é uma prioridade, e a comprovação de reservas financeiras robustas é a forma mais eficaz de garantir essa proteção.” — disse Souza.
Em um setor conhecido por sua volatilidade e riscos, a separação clara de fundos é vista como uma salvaguarda contra potenciais problemas. Esta abordagem, portanto, tem implicações significativas para a confiança do investidor.
Quando uma corretora demonstra que tem reservas, ela fornece uma camada de segurança que pode ser crucial para atrair e reter usuários.
Isso é especialmente importante em um cenário onde casos de fraudes e falências em plataformas de criptomoedas têm sido notícias frequentes.
Em outras palavras, se a corretora sofrer um hack, onde estaria a reserva para reembolsar os usuários?
Em 2023, por exemplo, diversas corretoras, como as gigantes Poloniex, CoinEx e Huobi sofreram ataques, com todas recorrendo a reservas próprias para lidar com a situação. Em nenhum caso as empresas sugeriram não possuir ativos próprios.
Jefferson Randolfo, especialista em criptomoedas e sócio da KriptoBr, considerando que, no universo das corretoras de criptomoedas, mesmo atuando como intermediárias, é uma prática comum e essencial a segurança dos bitcoins e outras criptomoedas, armazenando-os offline em dispositivos especializados.
“Essa abordagem é uma parte crucial do core-business dessas corretoras há mais de uma década, uma medida de precaução especialmente relevante diante dos frequentes relatos de invasões e hacks em plataformas do setor. Surge então a questão: como uma corretora poderia se recuperar financeiramente após um ataque cibernético? É por isso que, na KriptoBR, reforçamos consistentemente há mais de seis anos a importância de não deixar criptomoedas sob a custódia de terceiros, promovendo a segurança e a autonomia no gerenciamento desses ativos.”
Desde o colapso da corretora FTX, as corretoras de criptomoedas estão cada vez mais adotando o método das “provas de reservas” como uma forma de garantir transparência e segurança para os usuários.
Logo após a falência da então terceira maior corretora do mercado, muitas outras corretoras correram para mostrarem suas reservas. Isso serviria como uma prova de que os saldos dos clientes estão lá, parados, sem a necessidade de saques em massa.
A prática envolve a demonstração pública de que a corretora possui em reserva uma quantidade de criptomoedas suficiente para cobrir todos os saques solicitados pelos clientes.
A adoção das provas de reservas surgiu como uma resposta direta às preocupações com a solidez financeira das corretoras. Em um setor onde a confiança do usuário é primordial, essa medida visa fortalecer a confiança nas plataformas, mostrando que elas podem efetivamente cumprir suas obrigações, mesmo em momentos que as plataformas enfrentam dificuldades.
Ao colocar em dúvida suas reservas, uma corretora coloca em risco sua reputação, não apenas entre os usuários atuais, mas também potenciais novos clientes.
Os usuários, ao perceberem a possível falta de reservas, podem começar a questionar a solidez financeira da corretora. A situação também pode atrair mais atenção de reguladores, que estão cada vez mais atentos à estabilidade e práticas transparentes no setor e já planejam exigir a segregação de fundos em corretoras de criptomoedas no Brasil.
A sugestão de que uma plataforma não possui reservas adequadas pode, portanto, ser altamente prejudicial, afetando a confiança de sua base de clientes e sua posição de estabilidade no mercado.
O Livecoins procurou o Mercado Bitcoin para comentar o caso e fez as seguintes perguntas:
O Mercado Bitcoin, no entanto, se recusou a responder às perguntas acima e disse que o contexto correto foi ignorado pelo Livecoins.
Veja a resposta completa:
“Sobre o artigo publicado por este veículo, o MB lamenta a postura do autor em publicar uma matéria baseada em decisão judicial fora do contexto, sem o devido prazo para resposta e, pior, com a clara intenção de levar o leitor ao entendimento equivocado do tema.
O contexto correto, absolutamente ignorado pelo veículo, é que com base na jurisprudência majoritária dos tribunais, qualquer eventual restituição em caso de dano deve ser feita em reais, pela cotação do ativo na época do alegado evento. Portanto, não se trata de disponibilidade de ativos, mas do entendimento correto da justiça.”
Fabrício Tota, diretor do MB, também foi questionado com as mesmas perguntas, mas ele se recusou a responder sobre as reservas da corretora e disse que já havia sido respondido. As perguntas, no entanto, seguem sem respostas, o espaço segue aberto caso a corretora queira esclarecer as dúvidas dos usuários.
Fonte: Livecoins
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