Mais de 90% das movimentações feitas com criptomoedas, em julho deste ano, utilizaram stablecoins, apontam dados da Receita Federal publicados em setembro. O Tether USD representou quase 82% do total negociado utilizando criptoativos pareados ao valor de um ativo real.
Mesmo com a dominância do USDT, cinco diferentes empresas anunciaram stablecoins, pareadas ao dólar ou ao real, voltadas aos investidores brasileiros nas últimas semanas. O Cointelegraph Brasil conversou com cada um desses players para entender os motivos por trás do lançamento de um produto dentro de um mercado tão concorrido.
A USD Stablecolb (SCB) é uma stablecoin pareada ao valor do dólar e emitida na Suíça, utilizando uma estrutura idealizada pela Colb Asset SA. No dia 20 de setembro, a SCB foi disponibilizada aos brasileiros através de sua listagem na exchange Mercado Bitcoin.
Yulgan Lira, CEO da Colb Asset SA, conta que o objetivo não é competir com a Tether por um pedaço do mercado de stablecoins no Brasil. O principal objetivo da SCB é dar uma alternativa segura para os investidores que guardam valores em stablecoins.
“Oferecemos diversificação e segurança. A SCB tem a mais avançada e transparente estrutura de proteção do lastro existente em uma stablecoin”, diz Lira. A dominância do USDT, desta forma, não representa um obstáculo para a Colb.
O BRLA Token é mais uma das stablecoins surgidas nas últimas semanas, e é emitida pela empresa brasileira BRLA Digital. Diferente da SCB, a BRLA tem seu valor pareado ao real.
Matheus Moura, CEO da BRLA, também não se mostra preocupado com a dominância do USDT. Para Moura, o mercado de stablecoins, especialmente aquelas pareadas ao valor do real, ainda tem muito potencial de crescimento.
“Desde o último ciclo [do mercado cripto], muitas empresas de diversos setores passaram a incorporar a tecnologia blockchain em suas operações diárias, e a tendência é que ganhe ainda mais força nos próximos anos”, avalia Moura. “Assim como o dólar já não representa a maioria das transações globais e seu papel tende a diminuir, o mesmo acontecerá com as stablecoins”, acrescenta sobre o crescimento no uso de stablecoins.
O CEO da BRLA destaca ainda que empresas estrangeiras, inclusive as relacionadas ao setor de criptomoedas, enfrentam desafios consideráveis ao tentar operar no Brasil. O uso de uma stablecoin atrelada ao valor do real pode simplificar a entrada dessas instituições no mercado brasileiro, através da praticidade da conexão na blockchain.
“À medida que o mercado americano aparenta se fechar para o mundo das criptomoedas, o Brasil se posiciona na vanguarda da inovação regulatória, com regulamentações potencialmente favoráveis aos negócios e a criação do Drex (Digital Real Exchange), uma stablecoin lastreada no real brasileiro pode contribuir para que o país se torne um destino atrativo para empresas amigáveis às criptomoedas, ao lado de (e quem sabe superando?) outros centros globais, como Dubai e Singapura”, diz Moura.
O BRLX também integra o grupo de stablecoins lançadas recentemente, e também tem seu valor pareado ao real. A emissão é feita pela LoopiPay, e Cesário Martins, CPO da startup, acredita que uma stablecoin focada na América Latina se faz necessária.
“O BRLX foi concebido com o intuito principal de precificar ativos tokenizados cujo produto financeiro e lastro estão em Reais. Isso proporciona uma solução direta e eficiente para transações envolvendo esses ativos em redes públicas como Ethereum, Polygon, entre outras, eliminando o risco cambial tanto para o pagador quanto para o recebedor”, explica Martins.
Este é, na visão do CPO da LoopiPay, um diferencial crucial para uma stablecoin inserida no contexto latino-americano, já que as flutuações cambiais podem ser significativas e impactam diretamente as transações financeiras.
Além disso, Martins dá destaque ao foco do BRLX em segurança e transparência. “Projetamos nossa stablecoin para permitir uma fiscalização rigorosa, tanto por parte dos usuários quanto pelo público em geral, garantindo assim a confiança em nosso token”, diz o CPO da LoopiPay.
O plano é descentralizar a emissão do BRLX, revela Martins, através de parcerias com outras entidades que se mostrem emissores confiáveis. A iniciativa faz parte do compromisso da LoopiPay em reduzir o risco de contraparte e fortalecer a confiança no BRLX.
Embora reconheça que a stablecoin emitida pela Tether representa um desafio, Martins vê oportunidades no atendimento de demandas específicas de instituições e investidores do varejo do mercado de criptomoedas.
O Criptodólar UXD é a stablecoin emitida pela argentina Ripio, fundada em 2013, e que possui operações no Brasil. Assim como representantes de outros projetos mencionados, Sebastian Serrano, CEO da Ripio, destaca a demanda da América Latina por uma stablecoin que atenda as necessidades dos investidores da região.
“Em regiões que sofrem com a desvalorização, vemos cada vez mais pessoas migrando seus investimentos para stablecoins, que se tornaram uma alternativa para essa proteção e para ter investimentos mais ágeis. [...] [O UXD] se destaca por oferecer benefícios adicionais, como a isenção de comissão, o que significa que os usuários podem comprar UXD na Ripio com taxa 0”, aponta Serrano.
A Argentina, aponta o CEO da Ripio, é um bom exemplo da necessidade dos latino-americanos por uma stablecoin voltada à região. As instabilidades políticas no país fizeram com que o volume de negociação do UXD saltasse 112% no início de outubro, ocasionando também no aumento de 80% dos usuários.
Além disso, o UXD atua em conjunto com a LaChain, blockchain de primeira camada focada em transações rápidas e baratas, e dedicada ao público latino-americano. As aplicações eventualmente criadas na LaChain, portanto, utilizam o UXD como um elemento que potencializa as interações.
“Além dos benefícios aos clientes, a segurança e a transparência são pontos indispensáveis para a Ripio. Garantimos a paridade do UXD por meio de depósitos em dólares, stablecoins e investimentos líquidos de baixo risco, como os Títulos de Tesouro dos Estados Unidos”, conta o CEO da Ripio sobre o lastro da stablecoin.
Serrano também destaca que as stablecoins são alternativas válidas para proteção de patrimônio não apenas para as empresas, mas também para as instituições.
“Em países com inflação alta e acesso limitado a moedas estrangeiras, os criptoativos se tornaram a alternativa mais viável e atraente para guardar e gerenciar liquidez”, acrescenta Serrano à lista de motivos que incentivaram a criação do UXD, mesmo perante a dominância do USDT.
O BTG Dol foi a quinta stablecoin destinada ao público brasileiro emitida recentemente, cujo preço é pareado ao dólar. Andre Portilho, Head de Digital Assets do BTG Pactual, avalia que ainda há espaço para uma stablecoin que seja respaldada “por uma instituição regulada, com credibilidade, com balanço e com experiência no mercado financeiro”.
“Na nossa visão, stablecoin é o ‘killer app’ de cripto atualmente, o mercado diz isso pra gente. Por isso, acreditamos que há espaço para um player como a gente nesse segmento. É uma decisão muito estratégica, não só quanto à visão sobre a stablecoin e o que ela pode trazer para o mercado, mas pelo papel que podemos desempenhar com os diferenciais que a gente traz”, avalia Portilho.
O Head de Digital Assets do BTG conta que a instituição enxerga as stablecoins como mais uma tecnologia que pode ser utilizada para transacionar valores, e que cada vez mais bancos vão interagir com esses ativos digitais.
“Em uma visão de que a tecnologia cripto pode trazer ganho de eficiência em uma série de aspectos da indústria financeira, o dinheiro vai ser on-chain. Quando existem novas tecnologias, elas sempre mudam a forma como nós usamos o dinheiro, então nada mais natural do que nos engajarmos nisso”, conclui Portilho.
Fonte: cointelegraph
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