Vamos esbarrar em muito pedregulho ainda no trajeto para a adoção em massa das criptomoedas. Mesmo que o cenário aponte boas perspectivas, como o recente avanço na queda de braço entre a SEC e as gestoras sobre ETFs spot de bitcoin, teremos de arrebentar travas importantes em esferas como educação, usabilidade, escalabilidade, regulamentação, etc.

O Brasil é um dos países na vanguarda da adoção. Vem atraindo, inclusive, investimentos externos significativos no setor de blockchain e Web3 em geral dada a nossa simpatia pela temática, um grande diferencial em relação à hostilidade demonstrada pelos reguladores americanos. O nosso entusiasmo pelo mercado não é à toa, já que temos encarado a tecnologia como solução para diversos problemas reais dos brasileiros, não como ameaça.

 

A visão de utilidade se repete, em intensidade semelhante, em diversos países emergentes, que enxergam os ativos digitais e a tecnologia associada como formas de alterar o curso da história de suas economias, como combater a inflação e incluir no sistema financeiro a população desbancarizada.

O Brasil foi considerado o terceiro país mais preparado do mundo para a adoção cripto em levantamento recente da plataforma de educação HedgeWithCrypto. O método levou em consideração a taxa de adoção, a quantidade de caixas eletrônicos cripto em solo nacional e o número de buscas no Google.

Por aqui, em 2022, segundo o site, houve um aumento de 355% nas buscas mensais médias por criptomoedas. Quase um quarto da população (24%) possuía ou usava criptomoedas no ano passado, enquanto em 2020 a porcentagem era de apenas 13%.

Três anos atrás, inclusive, o Brasil também não tinha nenhum caixa eletrônico, mas desde então abriu 25. O texto cita ainda o Marco Legal dos Criptoativos como um dos principais impulsionadores da adoção. Para quem está curioso, os dois primeiros países do pódio são Austrália (1º), já bastante avançada em questões regulatórias, e os EUA (2º).

Recentemente, Jesse Pollak, personagem proeminente do setor e atual head de protocolos da corretora Coinbase, disse acreditar que estamos apenas no começo de uma gigante revolução. Na conferência da Ethereum (EthCC) em julho, em Paris, o engenheiro não economizou na previsão: para ele, até 8 bilhões de pessoas vão adotar cripto e blockchain na próxima década. O que significa praticamente toda a população mundial.

Imaginem que, para chegar a este patamar, precisaremos engatar a quinta marcha e ter sucesso em dominar a maioria dos entraves - se não todos. Será que dez anos são suficientes? A ver.

E quais seriam exatamente esses obstáculos?

Hoje, são contabilizadas aproximadamente 10 milhões de pessoas "on-chain", ou seja, usando ativamente moedas digitais ou participando de redes blockchain. O número pode parecer significativo, mas, quando Pollak menciona 8 bilhões de pessoas, fica evidente que só arranhamos a superfície do potencial que existe.

Desafios na conquista da adoção em massa

Atração de investidores institucionais

O embarque pesado dos investidores institucionais na criptoesfera é vital para a adoção em massa. E as perspectivas são boas. Eles acreditam esmagadoramente nos benefícios de longo prazo dos ativos digitais.

Ao menos foi o que mostrou um estudo recente da EY-Parthenon. Segundo o relatório, as instituições veem valor no potencial das criptos para diversificação de ativos, assim como em sua capacidade de gerar retornos assimétricos.

Considerando as mais de 250 instituições consultadas, 35% dos entrevistados disseram alocar entre 1% e 5% em ativos digitais e/ou produtos relacionados, com 60% indicando que alocavam mais de 1% de sua carteira. A maioria dos participantes afirmou a intenção de escalar os investimentos em ativos digitais nos próximos dois ou três anos.

O estudo justifica que o excesso de cautela dos institucionais decorre principalmente de três fatores: receio com incertezas regulatórias, dificuldade em identificar instituições confiáveis para se associar e necessidade de garantir a segurança e a custódia segura dos ativos.

Segurança e preocupações regulatórias

Com o número de usuários de criptomoedas crescendo de forma exponencial, serão imprescindíveis aprimorar e desenvolver novos recursos e tecnologias que assegurem a proteção dos ativos e as transações dos usuários. Os golpes e ataques se sofisticam com o tempo, e os protocolos precisam se esforçar para antecipar ameaças e corrigir falhas com a rapidez que o setor exige.

Os governos e reguladores também terão de colocar a mão na massa para estabelecer uma estrutura legal e diretrizes transparentes eficazes em fomentar o crescimento responsável, mas sem atrapalhar o fluxo da inovação.

Privacidade vs. transparência

O equilíbrio entre a privacidade do usuário e a transparência necessária para a conformidade regulatória é um dilema constante.

A transparência permite a rastreabilidade e auditoria das transações, sendo útil para fins regulatórios e de conformidade. Ela colabora para construir confiança na tecnologia, além de ajudar no combate a fraudes e atividades ilícitas.

Do outro lado dos benefícios, está a alta exposição do usuário, que pode sofrer o abuso de seus dados e prejuízos financeiros. Existem projetos que se debruçam especialmente sobre a questão da privacidade e, entre as tecnologias mais promissoras, está a baseada em prova conhecimento zero ou zero-knowledge (ZK). Essa metodologia permite provar algo sem revelar o que é.

Escalabilidade

A escalabilidade é a capacidade de uma blockchain ou rede lidar com um grande volume de transações de forma eficiente e rápida.

O assunto está na pauta prioritária dos desenvolvedores, que vêm avançando no tema, mas congestionamento e lentidão ainda são realidade nas redes. Isso resulta em baixo desempenho e taxas altas, o que colabora para tornar as criptomoedas menos atraentes para uso em transações cotidianas. Acontece bastante de as taxas superarem o valor do ativo que o usuário deseja comprar.

Interoperabilidade deficiente

Para quem ainda não está familiarizado com o termo, a interoperabilidade se refere à capacidade de as diferentes blockchains se comunicarem, compartilharem informações e executarem ações entre elas de forma eficiente e harmoniosa.

Imaginem o e-mail. Você tem uma conta no Google e o seu Gmail permite que envie mensagem para qualquer pessoa com uma conta no Hotmail (hoje se chama Outlook), para o endereço corporativo do seu amigo ou outro de qualquer natureza.

Na blockchain, não funciona assim, embora existam alguns pequenos avanços.

A dificuldade de interoperabilidade acaba se tornando um obstáculo à integração e fluidez dos movimentos e transações. A solução desse quebra-cabeça tecnológico é vital para a expansão massiva.

Educação

Não sei se você já sabe, mas eu sou professor. Tenho dedicado os últimos anos a ensinar milhares de pessoas sobre o universo das criptomoedas.

Quando você se educa, derruba barreiras individuais e culturais que normalmente nos impedem de evoluir.

No meio dos ativos digitais, acredito que não haverá adoção em massa sem educação, porque estamos tratando aqui de tecnologias disruptivas e precisamos nos preparar para explorar o melhor delas.

Um investidor sério é aquele que enxerga o potencial de longo prazo dos ativos digitais e tem um plano de ação. Conhecimento, experiência e prática são indissociáveis do sucesso neste mercado. Portanto, se você não está disposto a aprender, eu recomendaria nem começar a investir em cripto.

Fonte: exame