O mercado de criptomoedas ganhou seu marco legal em dezembro de 2022, embora o Banco Central ainda não tenha definido as regras. Muitos tópicos, contudo, ficaram de fora, como o metaverso. As advogadas Mírian Lima e Rosane Durão, que fazem parte da MetaSafe, contaram ao Cointelegraph Brasil a importância de estudos dedicados à regulação do universo virtual.
Da LGPD para o metaverso
Um relatório da empresa de segurança Elliptic, publicado em junho deste ano, aponta que o crescimento do metaverso pode incentivar lavagem de dinheiro e golpes nesse ecossistema.
Foi essa possibilidade que atraiu a advogada Mírian Lima para questões envolvendo o metaverso. A partir de sua área de atuação, que envolve questões ligadas à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), Lima notou que não haviam regras claras para o universo virtual quando o assunto era proteção de dados.
Não demorou para que a advogada notasse que, além da falta de previsão legal para questões envolvendo dados, o metaverso também começava a exibir ocorrências de crimes vistos no mundo real.
“Foi então que eu percebi que não tinha pesquisas científicas em português sobre o tema. Eu comecei a estudar com conteúdo de fora e isso me incomodou, fiquei me perguntando como o judiciário vai lidar com questões envolvendo dados, crimes e direito do consumidor. Foi quando vi a necessidade de montar um grupo de estudos sobre o tema”, conta Lima sobre sua imersão no metaverso e a criação da MetaSafe.
Com a abertura do grupo para novos membros, Lima afirma que profissionais com áreas de especialização diversas manifestaram interesse, criando um ambiente interdisciplinar.
A diversidade de profissionais e perspectivas sobre os novos desafios trazidos pelo metaverso culminou na publicação do livro “Novas Tecnologias e Metaverso: Perspectivas Jurídicas”, conta a também advogada Rosane Durão.
“A ideia é mostrar como o judiciário pode proteger e tutelar essas relações no mundo digital, que já são realidade”, diz Durão. “Esse é o projeto do livro, é disso que o livro trata. É uma leitura fácil, que traz novidades para a coletividade e mostra como esse novo mundo é acessível. Já existem pessoas no metaverso, empresas no metaverso e crimes no metaverso. Essa é a realidade hoje, e isso precisa ser debatido”, acrescenta.
Lançamento no metaverso
O livro publicado pelos membros da MetaSafe foi lançado em diferentes locais do Brasil, dentre eles, na capital de São Paulo em 15 de setembro. Além dos lançamentos físicos, a obra foi também lançada simultaneamente no metaverso Decentraland, dentro da área dedicada à comunidade brasileira.
Atrovenado, fundador do coletivo Decentraland Brasil, conta que a experiência foi uma oportunidade de apresentar o metaverso para agentes do direito que ainda não conheciam esse universo.
“É um assunto muito específico, então o engajamento não foi um dos maiores que já tivemos. Mesmo assim, foi muito interessante ver pessoas que estavam nas áreas físicas de lançamento tendo a curiosidade de pegar um dispositivo e ver como é o metaverso”, conta Atrovenado.
Necessidade de regulamentação
As advogadas contam que, atualmente, são aplicadas no metaverso as mesmas normas do arcabouço jurídico brasileiro através de analogias.
Como exemplo, Mírian Lima menciona a abertura da subseção da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de Lucas do Rio Verde dentro do metaverso. Ao participar do evento pelo seu computador, o metaverso utilizado capturou uma imagem de seu rosto sem autorização.
“Isso é biometria, e biometria é protegida pela LGPD. A plataforma pedia autorização sobre o meu avatar e outras questões, mas não pedia autorização para coletar meus dados biométricos. Eu poderia, então, encaminhar uma reclamação à empresa sobre a infração, ou fazer uma reclamação na ANPD [Autoridade Nacional de Proteção de Dados]”, explica Lima.
A propriedade de terrenos no metaverso é outro tema onde as normas brasileiras são aplicadas por analogia. Nesse caso, são utilizadas as regras contratuais do Código Civil.
“A nível de contratos, recorremos muito ao direito civil, o conceito é de direito civil. Com a blockchain, como a gente já sabe, é algo imutável. Mesmo que alguém altere, haverá o registro da alteração. Hoje, no metaverso, você compra um terreno com moeda digital e tem isso documentado através de um contrato imutável. O raciocínio, então, é o mesmo de comprar algo no mundo real: só quem pode vender é o titular”, aponta Durão.
A diferença, salienta Durão, é que essa negociação não é averbada em nenhum registro público. A prova, nesse caso, está na carteira do usuário.
“A gente avalia o que está disponível hoje e avalia o que pode ser aplicado no caso concreto, mas sentimos a necessidade de um aprofundamento, de uma regulamentação”, conclui Lima.
Fonte: cointelegraph